sexta-feira, 11 de maio de 2007

Todo texto tem que ter uma mensagem?

Lugar-comum: "Mas não tem uma mensagem?"
Utilização corriqueira: No meio de qualquer conversa que envolva algum tipo de arte - literária, musical, até mesmo as artes plásticas - e na qual os interlocutores não cheguem a alguma conclusão sobre o que a obra "representa".

Não se sabe muito bem o porquê, mas infelizmente, este é um lugar-comum de "primeira necessidade" nas mãos de quem não domina o assunto em discussão. Obviamente, nada contra a falta de domínio em si - o que causa preocupação é o instinto primordial de procurar "mensagem" em tudo, o que sugere que o processo de criação é sempre guiado por tentativas claras de manipulação ou, pelo menos, persuasão do leitor/espectador/ouvinte da obra em debate.

E a grande resposta para esta pergunta-lugar-comum é um sonoro "não". Nem toda obra de arte precisa ser composta a partir de uma idéia minuciosamente delineada. Em geral, a obra de arte que se define por uma mensagem muito clara termina por aprisionar o apreço artístico. Procurar "passar mensagens" no momento da criação limita o universo de possibilidades e aproxima a arte do panfleto, da propaganda e do texto de referência. A boa arte não é a que fornece respostas, e sim a que explicita a pergunta e convida o leitor/espectador/ouvinte a responder por si mesmo.

Pense nisso como a diferença entre um filme como Faça a Coisa Certa, de Spike Lee, e um suposto documentário sobre o caso Rodney King em Los Angeles. Um retrata a tensão racial em uma determinada comunidade em Nova York através da ficção, com diversos personagens representando pontos de vista diferentes sobre as mesmas questões - e agindo de acordo, o que leva à situação que fecha o enredo. O outro, provavelmente, irá apenas relatar os fatos que levaram aos distúrbios raciais em Los Angeles após Rodney King ter sido preso; se tornaria, então, uma mensagem clara do que pode acontecer se as mesmas condições se repetirem. Adivinhe qual dos dois é arte e consta na lista de filmes mais aclamados dos anos 90.

Esperar "mensagem" em obras faz lembrar de outro lugar-comum, aquele que reza que a "massa gosta de ser manipulada" - mas isso fica pra outro verbete do Senso Comum Para Leigos.